Dificuldade em acessar serviço digital torna idoso vulnerável a golpes

Auditoria da CGU aponta fragilidade inerente ao perfil do beneficiário

Dificuldade e limitação de idososFoto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

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A dificuldade e a limitação de idosos no uso de dispositivos eletrônicos e no acesso a serviços públicos digitais torna esse público vulnerável a golpes e fraudes. A constatação é da Controladoria-Geral da União que fez uma auditoria para entender o “súbito aumento” dos descontos associativos em pensões e aposentadorias do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Os auditores da CGU entrevistaram a 1.273 pessoas de todo o país para checar se esses beneficiários tinham autorizado os descontos.

Para surpresa dos auditores, 1.242 (97,6% dos beneficiários do INSS entrevistados) disseram que não autorizaram o desconto, ao contrário do que alegam as entidades investigadas. E 1.221 (95,9%) responderam que não estavam filiados a nenhuma associação.

Os entrevistadores apresentaram a alguns dos beneficiários parte da documentação entregue pelas organizações para justificar as cobranças. Os documentos incluem supostas fichas de filiação e autorização para o desconto.

“Houve casos em que os entrevistados não reconheceram a filiação, tampouco as assinaturas”, disse a CGU.

Além disso, as respostas levaram a CGU a concluir haver uma “grande probabilidade de os descontos estarem ocorrendo de maneira indevida”.

Auditoria expõe irregularidades

As entrevistas foram feitas entre abril e julho de 2024. Os auditores também visitaram parte das associações, confederações ou entidades autorizadas pelo INSS a deduzir os valores das mensalidades associativas diretamente das aposentadorias e pensões de filiados. Essas informações subsidiaram a elaboração de um relatório de avaliação.

O documento foi concluído em setembro, mas só foi tornado público na quarta-feira (23/04), após cerca de 700 policiais federais e 80 servidores da CGU saírem às ruas em 13 estados e no Distrito Federal para cumprir 211 mandados judiciais de busca e apreensão e seis de prisão temporária.

A operação resultou na suspensão de todos os acordos que permitiam às organizações cobrarem as mensalidades. Também levou à exoneração do então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, e ao afastamento de outros quatro dirigentes do instituto de suas funções.

Falhas nos controles digitais favorecem fraudes

Ao tratar o que classificou como “a vulnerabilidade dos beneficiários do INSS”, a CGU destaca que, dos 1.273 entrevistados, 922 (72,4% do total) desconheciam a existência do desconto associativo em seu benefício. De acordo com o relatório, o fato está associado à pouca familiaridade dos idosos com a tecnologia digital e com aplicativos como o Meu INSS, principal ferramenta para verificação dos extratos e para o requerimento do cancelamento dos descontos.

Os entrevistadores perguntaram sobre o aplicativo, e 540 entrevistados (42,4%) informaram que o desconheciam. Outros 320 (25,1%) disseram que conheciam, mas nunca o tinham utilizado. Já 413 (32,4%) afirmaram que já tinham feito uso do aplicativo, ressalta o relatório.

O documento lembra que, com a popularização do aplicativo Meu INSS, o instituto deixou de enviar o extrato em papel para seus beneficiários. Quem não utiliza o aplicativo precisa ir a uma agência da Previdência Social para acessar essas informações.

A utilização de ferramentas digitais por uma minoria dos beneficiários do INSS limita a capacidade de o cidadão identificar possíveis descontos realizados sem sua autorização. Essa situação se agrava pelas fragilidades de controle relacionadas à inclusão desses descontos na folha de pagamento do INSS, alerta o relatório.

Dos 351 beneficiários que já sabiam do desconto ao serem entrevistados, 123 (35%) não tinham pedido ao INSS o fim da cobrança.

Conforme o relatório, aqueles que não solicitaram o cancelamento podem, eventualmente, ter enfrentado dificuldades para realizar tal pedido.
Essas dificuldades incluem o acesso ao Meu INSS, que exige o nível ouro na conta Gov.br. Também é necessário preencher número do benefício ou nome da entidade para a realização do requerimento.

Idosos vulneráveis no meio digital

O documento ressalta que “os resultados sinalizam que os beneficiários encontram mais dificuldades para bloquear os descontos do que as entidades para implementá-los”. Isso indica uma fragilidade na proteção dos direitos dos beneficiários do INSS.

Verifica-se que a transformação digital ocorrida no INSS ocorreu sem o devido aperfeiçoamento dos controles internos. Isso elevou os riscos relacionados à realização de descontos associativos indevidos, aponta o documento.

De acordo com o documento, “importa ressaltar que a própria fragilidade inerente ao perfil dos beneficiários, em sua maioria idosos, contribui para a dificuldade de acesso a canais digitais. Essa limitação se agrava devido à deficiência dos instrumentos de controle do INSS. Como resultado, os beneficiários tornam-se suscetíveis à atuação de terceiros que buscam obter, sem o devido esclarecimento, a documentação relativa à filiação e à autorização para o desconto associativo”.

Agência Brasil

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