Três policiais militares são investigados por participação em um esquema milionário que pagava facções criminosas para devolver veículos roubados. O objetivo das negociações era evitar que cooperativas e associações de proteção veicular arcassem com o valor total das indenizações aos clientes.
A Polícia Civil do Rio deflagrou nesta sexta-feira (23) uma nova fase da Operação Torniquete, que mira um esquema que movimentou mais de R$ 11 milhões em menos de um ano. O grupo criminoso é formado por empresários, traficantes e, segundo a investigação, até agentes públicos.
As empresas, conhecidas como “pronta resposta”, eram contratadas por cooperativas de proteção veicular e negociavam diretamente com traficantes e receptadores para recuperar veículos roubados, principalmente em comunidades dominadas por facções como o Comando Vermelho (CV) e o Terceiro Comando Puro (TCP).
De acordo com a Polícia Civil, apenas duas associações pagaram mais de R$ 11 milhões a quatro dessas empresas em 11 meses, resultando na devolução de mais de 1.600 veículos.
O índice de recuperação de veículos dessas empresas chamou atenção: chegou a 80% em fevereiro de 2025, o que reforçou as suspeitas de ligação direta com o crime organizado.
Durante coletiva, o secretário de Polícia Civil do Rio, Felipe Curi, destacou a dimensão inédita do esquema:
— “São uma operação e uma investigação inéditas. Nunca houve uma ação desse porte envolvendo roubo de veículos nesse contexto. As cooperativas contratavam essas empresas, que faziam contato direto com os traficantes e pagavam, em média, 10% do valor do carro na tabela Fipe”, afirmou.
Segundo ele, o cliente, que acreditava estar protegido, na verdade era vítima de uma engrenagem criminosa:
— “O cliente, sem saber, é vítima do próprio serviço que contratou”, ressaltou Curi.
Como funcionava o esquema?
As empresas de “pronta resposta” atuam, oficialmente, para localizar e recuperar veículos roubados, evitando que as cooperativas precisem pagar a indenização total. Porém, segundo a polícia, essas empresas negociavam diretamente com facções, pagando valores que variavam entre R$ 6 mil e R$ 10 mil por carro — cerca de 10% do valor do veículo na tabela Fipe. Para motocicletas, o valor pago podia chegar até 30% do valor de mercado.
O modelo, além de mais barato para as empresas, virou uma fonte rápida de renda para o crime. O cliente, sem saber, acabava financiando um sistema que incentiva ainda mais roubos.
A velocidade na recuperação dos veículos — em média, quatro dias — chamou a atenção dos investigadores, reforçando a suspeita de colaboração direta com os criminosos.
Para o secretário Felipe Curi, essa prática fortaleceu o tráfico:
— “Essas quadrilhas contam com especialistas em roubos e com o poder de fogo que o tráfico oferece”, disse.
Impacto nos roubos de veículos
A Polícia Civil afirma que o esquema contribuiu diretamente para o aumento dos roubos de carros na capital e na Baixada Fluminense nos últimos meses. O delegado André Neves, do Departamento Geral de Polícia Especializada (DGPE), fez um alerta:
— “Fica o alerta para quem insiste em se beneficiar desse sistema e para os agentes públicos envolvidos. A Polícia Civil está em cima, e a resposta será à altura. Temos, sim, agentes duplos: três policiais militares estão sob investigação”, declarou.